domingo, 6 de abril de 2008

As cartas de Vita Sackville-West (1ª Parte)


"Comecei a escrever sem me deter a pensar sobre a tarefa. Alguma vez a completarei?, e em que circunstâncias?, tendo começado assim, na margem existente entre um bosque e um campo de milho pronto a ser colhido, com as leves sombras das ervas e das espigas de milho a caírem-me sobre as páginas. Atrás de mim, pendem os ouriços vazios das nozes, junto à orla do bosque; estou deitada em fetos verdes, entre florinhas silvestres amarelas e magenta, cujos nomes desconheço, tão perto do chão que a única vista que tenho é a do milho alto, tão seco que se agita com a brisa, com um barulho semelhante ao roçagar da seda. Estive todo o dia de mau humor, mas já passou. Aqui, não há lugar para temperamentos ou personalidades, só há uma personalidade presente: Deméter. Ontem estive no mar, num barco à vela; o mar estava muito agitado e, por vezes, tive um medo terrível, mas bem que desejava não ter medo, porque, teoricamente, gosto de ver o barco enterrar o nariz nas ondas, de ver a espuma a quebrar-se no convés e, depois, sentir a cara toda molhada e o sabor do sal nos lábios. O mundo do mar é um mundo diferente. Há todo um conjunto diferente de ruídos - o marulhar das ondas , o vento nas enxárcias, o ranger das vigas, os gritos da tripulação - e tem-se um conjunto diferente de desejos e preocupaçôes - o desejo que o barco fique quieto nem que seja por cinco minutos, um descanso do perpétuo balançar, a preocupação quanto ao vento, se aumenta ou abranda, ou lá o que for; a imensa, a esmagadora importância do tempo, no que respeita tanto ao conforto como ao avanço."

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